PELADA DE VERDADE
- Capítulo I
O dia em que o Carlos “Maluquinho” virou um nobre Barão
O
campo do cometa era bem ao lado do rio “Faria Timbó”, pouco importava se fedia
ou se era imundo, pra gente naquela época, era o nosso Maracanã.
Domingo
bem cedo, vendedores de laranja descascada e de limonada já se postavam ao
redor do campo, nós ficávamos atrás de um dos gols ou próximos a linha lateral do rio, para atuar
como gandulas e ganhar uma laranja ou um trocado ao final do jogo.
No
meu caso não era bem isso que me motivava, na verdade eu adorava sair apostando
corrida para ver quem chegava primeiro na bola e depois poderia dar um chute
bem forte na G32 gomos, era “show de bola”!
Na
época quem era “grande” e bom de bola por ali, jogava no time do “Bombeiro” ou em
um dos 2 times do “velho”, o misto quente (time principal) ou no misto frio
(uma espécie de aspirante). Havia outros times no lugar, mas nenhum deles tinham
aquela mística e charme que esses dois possuiam.
Esses
2 donos de times, não chegavam a ser mecenas, não davam salários para seus
jogadores, mas já traziam de casa todo o uniforme completo e limpo, pagavam o
campo dos atletas e quando o jogo era apostado e ganhavam, podiam beber muita
cerveja, refrigerante e ás vezes rolava até um galeto pra matar a fome.
Naquele
domingo foi diferente, chegou um ônibus de viagem trazendo um time de outro
estado que dizia carregar na bagagem uma invencibilidade de longa data, papo de
2 anos sem perder.
Os
caras desceram do ônibus “cheios de perna” ou cheios de “marra” pra ser mais
atual. No aquecimento só “porradão” pro gol castigando o goleiro, quando
começaram a se vestir já pareciam estar vencendo por uns 10 a 0 só pela beleza
dos uniformes, eram lindas camisas do E.C. Bahia “oficiais”, com calção numerado
meião e tudo, demais.
O
jogo inicia e ao final do primeiro tempo o placar é de 3x0 para os visitantes,
os caras atropelaram o Misto quente, o cenário era mais do que sombrio, o que
fazer?
Velho
reuniu o time no intervalo e pediu calma, enquanto abanava os caras com toalhas
e panos, dava laranjas pra chupar e pensava sozinho com seus botões no que
fazer, foi quando veio o estalo:
-
Talvez o Maluquinho com sua velocidade e sorte pra meter gols possa nos salvar,
mas cadê a “pôrra” do Maluquinho?
Velho
odiava ter que dar o braço a torcer e ter que chamar jogador “biriteiro” em
casa e após uma noite de esbórnia no Salgueiro ou na Portela, nem pensar. Só
que a coisa estava preta e o banco um verdadeiro deserto, era melhor se
resignar.
Chamou
um dos moleques no canto e ordenou:
-
Vá lá na casa do Maluquinho e traz aquele puto até aqui, fala que eu to mandando
ele vir aqui e que ele vai ganhar um bicho gordo.
Antes
de reiniciar o jogo Maluquinho já estava em campo, saltitando numa tentativa de
se aquecer a jato e ainda cheirava a cevada, mas sonhava com a proposta que o
Velho havia lhe feito alguns minutos antes. Se fizesse o time virar o jogo,
iria ganhar um “BARÃO”, era como a galera apelidara uma nota de 1.000 cruzeiros,
que havia sido recém lançada pelo Banco Central.
Jogo
quente do jeito que o Maluquinho gostava, dribles, arrancadas, lançamentos e chutes
fortes, provocações de ambas as partes e um jogo apostado, era um prato cheio.
Logo
na primeira bola que lançaram para o Maluquinho nas costas do zagueiro, ele nem
deixa bater no chão, dá um tapa na bola jogando na frente do zagueiro, ganha na
corrida e bate forte em diagonal, estufando o barbante, era o 1x3.
Corre
e pega a bola, leva pro meio e após nova saída, nem deu tempo de respirar, o
volante do Misto quente rouba a bola do atacante adversário, toca para
Maluquinho que de primeira já tabela com o Marquinho, recebe na frente, dá um
drible da vaca no zagueiro e sofre falta na entrada da área. Maluquinho ajeita
e coloca no ângulo, sem chance de defesa, era o 2º gol e delírio da galera que
já lotava o campo.
Toda
hora alguém chegava e ia se juntando a multidão que já estava alucinada com
aquele partidaço de domingo.
Após
o segundo gol do Misto, o jogo foi ficando duro, com muitas faltas, poucos chutes
e quase nenhum trabalho para os 2 goleiros, o time adversário amarrava o jogo
para sair com o resultado positivo fora de casa, mantendo a invencibilidade,
mas só esqueceram de avisar ao Maluquinho, que a essa altura já era caçado em
campo e já tinha marcador exclusivo.
Aos
40 do segundo tempo, um escanteio na esquerda, Fael se ajeita pra cobrança e
Maluquinho vem pra perto pedindo para que ele bata para ele, naquela jogada
curtinha que muitas vezes são feitas e não dão em “pôrra” nenhuma.
Fael
toca curto para Maluquinho, ele balança na frente do beque, ginga para um lado,
sai pelo outro e faz que vai centrar para a área, os 2 beques que vinham na
cobertura viram-se de costas e também são driblados, quando Maluquinho já está
dentro da área em posição de perigo próximo a pequena área, solta um canhão que
entra no ângulo oposto, GOOOOOOOOOOOOOOOOOOLLLL, GOLAÇO!!!! Era o 3x3.
Maluquinho
empata o jogo sozinho e fazia uma partida espetacular, todo mundo só pensava na
virada, pois agora era possível, aquele jogo já era nosso.
“Velho”
estava passando mal na beira do campo, não conseguia nem mesmo balbuciar alguma
coisa, não dava espôrro, não falava absolutamente nada, exceto a curta
expressão:
-
Valeu Maluquinho! Toda vez que ele tocava na bola.
O
jogo ficou mais amarrado ainda e agora os caras já estavam satisfeitos com o
empate, só que aos 45 do segundo tempo, depois de muita troca de passe do Misto
quente, uma bola é aprofundada para o lateral Clay, ele dribla o último
zagueiro e já dentro da área deixa o beque encostar nele e se joga cavando o pênalti.
Só
que na dúvida, quando todo mundo parou para saber o que seria dado, Maluquinho que
já vinha na corrida, pega a bola, usando o direito da vantagem e manda um
balaço nas redes, fazendo o gol derradeiro, era o 4x3 e fechava o caixão dos
visitantes.
Ocorre
que o juiz apita o final do jogo e diz que fez isso antes do Maluquinho fazer o
quarto gol, confusão armada, porrada pra tudo quanto é lado, uma confusão dos
diabos. Só depois de muito tempo e a chegada de uma “joaninha” da PM, é que as
coisas se acalmaram e o juiz pode sair de dentro da casa de um morador vizinho
ao campo, senão seria linchado pela galera.
Os
visitantes não quiseram pagar a aposta e saíram rapidinho, O juiz não recebeu a
grana para apitar e foi embora dentro do fusquinha da PM e nem Maluquinho recebeu
seu bicho gordo, pois não conseguiu virar a partida, apesar de todo o seu esforço
e de uma atuação galáctica.
O dinheiro ficou no pendura e no imaginário deste escriba e de uma coisa Maluquinho nunca mais poderá se esquecer, daquele dia em diante, ele que se chamava Carlinhos, teve seu apelido alterado para sempre e todo o ENGENHO de DENTRO conheceu a nobreza através do “BARÃO”, por motivos mais do que óbvios.
O dinheiro ficou no pendura e no imaginário deste escriba e de uma coisa Maluquinho nunca mais poderá se esquecer, daquele dia em diante, ele que se chamava Carlinhos, teve seu apelido alterado para sempre e todo o ENGENHO de DENTRO conheceu a nobreza através do “BARÃO”, por motivos mais do que óbvios.
Um
forte Abraço
Serginho5Bocas